terça-feira, janeiro 31

É o amor.


Já disse e repito: amor é pecado.

Não me venham com essa de que o amor é que nos redime; que o amor é a solução para as guerras e para a fome no mundo; que o amor reduz a criminalidade; que o amor emagrece, diminui o colesterol e combate os radicais livres; que o amor é lindo.
É o cacete.
Amor é egoísmo ao quadrado.
Amor de pai com os filhos (que acontece de ser uma das especialidades da casa), por exemplo, não dispensa uns carinhosinhos, de quando em quando. E aumenta com o orgulho de uma bola bem chutada, um desenho caprichado ou a primeira palavra escrita – e orgulho, aliás, é a variação light da soberba, um dos sete capitais.
Nem amor de mãe é altruísta – experimenta dizer que prefere a massa mais al dente, ou tente não ir ao casamento do primo Niltinho, ou, se quiser arriscar mesmo, case com uma mulher com tatuagem. Tudo porque mamãe gosta de você, claro – mas só se você gostar dela de volta. E demonstrar isso com uma obediência kamikaze.

Amor de homem e mulher, então, quase nem preciso explicar. Só nos livros do Camilo a mocinha gosta tanto do lindão que aceita que ele fique com a outra, que ele ama. E, ainda assim, de ter a vontade contrariada, acaba sempre num convento, ou maluca. Ou as duas coisas.
Por isso, já disse e repito: o pecado original não é comer a maçã, não é comer a Eva, não é o egoísmo.
É o amor.

quinta-feira, janeiro 26

Stupid Design.

Acreditar em rituais. Isso é o que eu deveria fazer: acreditar em rituais.

Como quando era pequeninho: se Deus existe, meu pai hoje vai chegar mais cedo. Depois: se Deus quiser que eu fique aqui estudando a tabela periódica, vai dar um sinal – o telefone vai tocar (não toca, não toca, não toca...). Mais tarde: se ela gostar de mim, vou passar naquele portão e Deus não vai deixar o cachorro latir.

E se meu pai chegasse mais cedo, eu agradecia a Deus, lá no fundo. E se o telefone tocasse, eu ia atender e acabava esquecendo a tabela periódica, e me sentia culpado de ter desafiado Deus, que avisava de Sua presença pelo telefone, e estudava, até decorar, os malditos pesos atômicos (aliás, todo mundo se pergunta para que raios estudar a tabela periódica, mas ninguém se pergunta porque fazer duas sérias de quinze no supino. É a mesma coisa, caramba! Mas, divago). E se o cachorro não latisse, eu ria até chegar em casa, quase dançando no meio da rua, crente que Deus existia: ela gostava de mim, mesmo...

Isso devia virar religião, mas não virou. O que sobrou foi saudades do meu pai chegando em casa; um certo sentimento de culpa, quando toca o telefone, e uma raiva danada desses cachorros cretinos que se esgoelam no portão, quando eu passo.

sexta-feira, janeiro 13

Constatações da praia.

1. O mar é um vidrão de rinosoro.

2. Cinqüentonas que gostam de bric-a-brac são anti-ecológicas, não só por afanar as conchinhas da praia, mas porque, ao fazê-lo, exibem mais do que o coração humano é capaz de suportar.

3. A praia não é um bom lugar para pensar.