Patriarca
Por puro nepotismo - meu irmão é dono do jornal - publico mensalmente uma coluninha num periódico do litoral paulista. Este é o texto que vai ser publicado nos próximos dias (o jornal é periódico, ma non troppo). O tom é diferente deste bloguinho, mas esta semana não vou conseguir escrever mais nada para postar aqui. Por isso, serve de tapa buraco, e para que não pareça que abandonei tudo e fui morar na Nova Zelândia.
Passo, quase todo dia, pela Praça do Patriarca. A estátua dele, que já foi central, está agora tímida, deslocada numa lateral próxima à Líbero Badaró, que divide com estátuas vivas de anjos andróginos. A única potencial vantagem de sua posição de agora é estar de frente para as Lojas Marisa, onde pode observar, o dia inteiro, as moças que vão comprar calcinhas e sutiãs.
Mas cada vez que passo lá lembro-me de um trecho do seu “Pensamento Vivo” (que é uma espécie de best of, feita nos anos 40), no Dicionário de Citações do Paulo Rónai: “Os brasileiros são entusiastas do belo ideal, amigos da sua liberdade, e mal sofrem perder as regalias que uma vez adquiriram. Obedientes ao justo, inimigos do arbitrário, suportam melhor o roubo que o vilipêndio; ignorantes por falta de instrução, mas cheios de talento por natureza; de imaginação brilhante e por isso amigos de novidades que prometem perfeição e enobrecimento; generosos, mas com bazófia; capazes de grandes ações, contanto que não exijam atenção aturada e não requeiram trabalho assíduo e monotônico; apaixonados do sexo por clima, vida e educação. Empreendem muito, acabam pouco. Serão os atenienses da América, se não forem comprimidos e desanimados pelo despotismo”.
A cada dia, as notícias políticas confirmam boa parte desse diagnóstico.
Na última semana, vimos a dança da impunidade, naquele grande salão de baile brasiliense. Vimos o caseiro, que denunciou o ministro. Vimos depósitos na conta bancária do caseiro. Vimos o ministro finalmente largar o osso. Mas o que esperavam de um ministro que foi eleito prefeito de uma cidade, prometendo, por escritura passada em cartório, que não largaria a prefeitura, e largou?
E passa este escândalo, e passa esta CPI, e continuamos achando isto aqui uma beleza; continuamos sofrendo cada vez que nos tiram um “direito adquirido”; continuamos dando pouca importância para os roubos; continuamos ignorantes, desatentos e preguiçosos; continuamos apaixonados por sexo e continuamos tentando muito e realizando nada.
O Patriarca, agora empedernido no seu pedestal (e decerto procurando, de lá de cima, aculturado, uma brechinha nos provadores da Marisa) deve arrepender-se só da frase final: mesmo sem opressão despótica, não viramos os atenienses da América – faltou-nos, para que chegássemos lá, um pouco da alma espartana.
Passo, quase todo dia, pela Praça do Patriarca. A estátua dele, que já foi central, está agora tímida, deslocada numa lateral próxima à Líbero Badaró, que divide com estátuas vivas de anjos andróginos. A única potencial vantagem de sua posição de agora é estar de frente para as Lojas Marisa, onde pode observar, o dia inteiro, as moças que vão comprar calcinhas e sutiãs.
Mas cada vez que passo lá lembro-me de um trecho do seu “Pensamento Vivo” (que é uma espécie de best of, feita nos anos 40), no Dicionário de Citações do Paulo Rónai: “Os brasileiros são entusiastas do belo ideal, amigos da sua liberdade, e mal sofrem perder as regalias que uma vez adquiriram. Obedientes ao justo, inimigos do arbitrário, suportam melhor o roubo que o vilipêndio; ignorantes por falta de instrução, mas cheios de talento por natureza; de imaginação brilhante e por isso amigos de novidades que prometem perfeição e enobrecimento; generosos, mas com bazófia; capazes de grandes ações, contanto que não exijam atenção aturada e não requeiram trabalho assíduo e monotônico; apaixonados do sexo por clima, vida e educação. Empreendem muito, acabam pouco. Serão os atenienses da América, se não forem comprimidos e desanimados pelo despotismo”.
A cada dia, as notícias políticas confirmam boa parte desse diagnóstico.
Na última semana, vimos a dança da impunidade, naquele grande salão de baile brasiliense. Vimos o caseiro, que denunciou o ministro. Vimos depósitos na conta bancária do caseiro. Vimos o ministro finalmente largar o osso. Mas o que esperavam de um ministro que foi eleito prefeito de uma cidade, prometendo, por escritura passada em cartório, que não largaria a prefeitura, e largou?
E passa este escândalo, e passa esta CPI, e continuamos achando isto aqui uma beleza; continuamos sofrendo cada vez que nos tiram um “direito adquirido”; continuamos dando pouca importância para os roubos; continuamos ignorantes, desatentos e preguiçosos; continuamos apaixonados por sexo e continuamos tentando muito e realizando nada.
O Patriarca, agora empedernido no seu pedestal (e decerto procurando, de lá de cima, aculturado, uma brechinha nos provadores da Marisa) deve arrepender-se só da frase final: mesmo sem opressão despótica, não viramos os atenienses da América – faltou-nos, para que chegássemos lá, um pouco da alma espartana.
3 Comentários:
Mauro,
Acho que nem com alma espartana nós chegaríamos lá. Nós devemos assumir nosso destino e declarar, em alto e bom som: Somos tuedos paraguaios
Um abraço,
Marcos
mauro,
não gosto do modo como o Patriarca nos definiu, não gosto da confirmação desta definição, não gosto de pensar que não tem jeito. Mas gosto, tremendamente, de ler vc. beijos
Olá, Marcôs. Sim, e isso explica nossa paixão pela Perla. Ei, Claudiá, o Boni era gente fina. No wonder acabou na Globo...
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