Papo de botequim.
Ouvi uma conversa diferente, num restaurante. Eram dois casais de mais de trinta, com os filhos, todos pequeninhos, desmontando a mesa, enquanto os pais e as mães alternavam, com uma facilidade incrível, urros ferozes e biquinhos melosos.
Um dos casais repetia a lenga-lenga da desesperança pátria. Queriam emigrar para a Nova Zelândia, para a Itália, para os EUA, até, para fugir da violência e dos horizontes tupiniquins. O homem do outro casal era audivelmente francês, e balançava a cabeça, detentor de segredos superiores.
Foi sua mulher que disse: - Pois mudamos de Paris para São Paulo justamente por causa da falta de perspectivas e pela qualidade de vida. Lá em Paris, babás ganham mais que eu, na clínica. E olhe que eu tinha pacientes…
Só então percebi que num canto da mesa havia uma mocinha mulata, de roupa branca e cabelo preso. Comia o mesmo que as crianças e ao lado delas - penne ao sugo e batatas smiles, Deus os perdoe.
A conversa deles continuou, com as reclamações de praxe contra os impostos exagerados, e os planos de saúde, e as taxas de condomínio e as mensalidades escolares, muito embora, todos ali - menos o francês - confessassem terem votado no FHC pelo menos uma vez, e no Lula, na última.
Socialismo moreno é assim: aumentamos a diferença social, damos empreguinhos com salário de miséria aos empregados - que, como antes de 1888, são da família, são da família - e defendemos a igualdade. Pelo menos da porta de casa prá lá.
6 Comentários:
quem arruma sua cama?
The missus, anônimo. Mas temos ajuda, e pagamos o máximo possível.
máximo possível seria qto? curiosidade, apenas.
Um equilíbrio difícil, entre o que a pessoa merece, e o que a vizinhança aceita, sem chamá-lo de canalha, por inflacionar o mercado. But we are missing the point. O problema não é só o quanto se paga, mas o como se trata.
delicada essa questão. Como não ser "de casa" uma pessoa que trabalha com seus filhos, faz a comida deles. Como estabelecer os limites necessarios na relacao patrao-empregado sem ferir suscetibilidades?
(É o mesmo anônimo? Enfim.)
Quando alguém vem me encher com uma reclamação trabalhista da doméstica recém-demitida, sempre diz: "puxa, mas ela era da família, como pôde fazer isso?". Sempre respondo: da família? Botou ela no testamento?
O problema não são as suscetibilidades (que lembram frescurinhas). É de respeito: empregadas com pratinhos e copinhos e garfinhos segregados, como se fossem tuberculosas; empregadas que não almoçam senão depois dos patrões; que dormem em quartinhos úmidos e mal-cheirosos, como se fosse um favor.
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